O Café e o Mascate

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Líbano-Brasil
O Café e o Mascate

“Na segunda metade do século XIX e sobretudo após 1880, o campo de trabalho dos mascates alargou-se consideravelmente, a tal ponto que o colono procurou libertar-se das compras nos armazéns do fazendeiro. Uma terceira onda de mascates ocorreu um pouco mais tarde. Os sírios, sobretudo marunitas, negociantes inveterados” (Os Mascates ou Mercadores Ambulantes do Brasil – Pierre Deffontaines – Boletim Geográfico, V.55, 1947).

Desde os tempos coloniais até quase os fins do século XIX, o mascate e o ambulante “de valia eram portuguêses. Depois veio a época dos italianos. Mais tarde os sírios” (Comércio Ambulante e Ocupações de Rua no Rio de Janeiro – Everaldo Backheuser, Revista Brasileira de Geografia, Vol.1 – 1944).

“Nessa época [2ª metade do século XIX], eram os […] italianos que exerciam esta atividade.”

“Os sírios, descobrindo por volta de 1885-1890 o Brasil, açambarcaram em breve grande parte do pequeno comércio. Mantinham entre si uma solidariedade íntima, que triunfou em toda concorrência” (Os Indivíduos-Tipos do Brasil – Pierre Deffontaines – Boletim Geográfico nº 50 – 1947).

O florescimento econômico do comércio interno, desde as últimas décadas do século passado, é efeito do acentuado comércio inter-regional. O comércio interno orienta-se em duas direções principais, verticais entre si, ou seja, para o Oeste e rumo Norte-Sul.
O comércio interno do Centro-Oeste é fraco, devido à pouca densidade populacional e aos insuficientes meios de transportes. Graças à E.F. Noroeste e à E.F. Goiás, o comércio regional vem se desenvolvendo. Em Mato Grosso, Campo Grande desempenha importante papel nas trocas comerciais, notadamente na mascateação, desde o início do século.

No norte do Brasil, Manaus, Belém e algumas cidades da bacia amazônica são os principais centros comerciais, sendo que os núcleos de povoamento nas margens dos rios são servidos por embarcações típicas por meio das quais os mascates e os regatões realizam seu comércio.

No Brasil Oriental (Bahia, Minas Gerais, Espírito Santo), o comércio interno é bem desenvolvido. O desenvolvimento comercial abrange o desenvolvimento da mascateação, que progrediu para outras formas de comércio paralelamente ao café e à riqueza por ele trazida.

No Brasil Meridional, os polos mais importantes são Rio de Janeiro e São Paulo. O comércio atacadista abrange tanto artigos nacionais como importados. Foi nesses dois estados que a mascateação teve seu campo mais ativo.

A expansão da cultura cafeeira em São Paulo e a consequente abertura de novas fazendas desenvolveu o comércio ambulante. E, justamente nessas novas regiões cafeeiras, o nível de vida tornou-se elevado, exigindo um comércio ativo no qual se estabeleceram, entre outros, imigrantes libaneses e sírios cuja maioria praticava a mascateação. A tendência desses comerciantes ambulantes é a fixação definitiva na zona cafeeira que se projetou para os Estados limítrofes.

A reportagem abaixo transcrita elucida o fato com relação ao Estado de Mato Grosso.

“Muitos são os louvores que merecem todas as colônias estrangeiras no que diz respeito à colaboração para o progresso de Campo Grande. Mas uma colônia existe que, dentro de sua modéstia, muito tem feito para o engrandecimento da “Cidade Morena”, no Estado de Mato Grosso: é a colônia árabe.

“Retornemos a meio século. Ainda em todo o velho continente falava-se no lendário velocino de ouro e na fonte da juventude da América. De vez em quando, aparecia em Beirute, Zahlé, Damasco e em outras cidades um americano, como eram chamados, naquele tempo, os poucos que regressavam à pátria com fortuna. Atraídos pelos tais americanos, eram centenas, milhares e milhões de pessoas que, vendendo o que possuíam, empreendiam a travessia do Mediterrâneo e do Atlântico com a ideia de, em pouco tempo, retornar à pátria com grandes fortunas. Essa travessia era feita sem o menor conforto, cheio de incômodos.

“Espanhóis, portugueses, italianos, todos, primeiro os homens. Os casados voltavam logo, trazendo as famílias. Mas os árabes, não. Com sangue nômade e beduíno nas veias, não se conformando em deixar nada atrás de si e com os recursos de que dispunham, apertados, prensados nos porões de terceira classe, com as vistas perscrutando o céu, à procura do Cruzeiro do Sul, nova Meca para eles, ainda que fosse para passar fome, privações e até morrer, iriam todos juntos. As mulheres acompanhando os maridos para o desconhecido, bom ou mau.

“Eis aí de que têmpera eram os Bandeirantes desconhecidos, alguns deles fundadores e precursores destas cidades do “hinterland” deste imenso e rico Brasil.

“Naquele tempo, desembarcavam os árabes em Santos ou no Rio de Janeiro e reembarcavam, via fluvial, para Montevidéu, a procurar Corumbá, viagem, esta, de novas vicissitudes e privações (…).

“(…) A porcentagem de árabes e de seus descendentes em Campo Grande é calculada em 60% da população, havendo entre eles filhos dos primeiros árabes que aqui chegaram, médicos, advogados, engenheiros, dentistas etc., sentindo-se todos eles orgulhosos de serem brasileiros e, com aquiescência dos pais, os quais se sentem no Brasil tão bem como na terra que os viu nascer (…).” (Bandeirantes Desconhecidos – A Colônia Árabe de Campo Grande – Jornal de Notícias, Secção Pelo Interior, 30-08-1949).

O censo de 1940, com referência ao número de estrangeiros árabes, que são os que se ligam ao comércio ambulante, revela a íntima relação entre o fenômeno de concentração desses elementos em certas regiões brasileiras e a respectiva prosperidade econômica e comercial.

Assim, de um total de 41.236.315 habitantes, temos o seguinte:

  população atual árabes muçulmanos
NORDESTE 9.933.642
Pernambuco 2.688.240 239 5
Maranhão 1.235.169 310 200
Ceará 2.091.032 385 2
       
LESTE 15.625.953
Minas Gerais 6.738.416 5.715 131
Rio de Janeiro 1.847.857 2.430 64
Bahia 3.918.112 892 97
       
SUL 12.915.621
São Paulo 7.180.316 22.372 1.393
       
CENTRO-OESTE 1.258.679
Mato Grosso 432.265 1.012 137
     

O sírio e o libanês são audaciosos para os negócios e enveredam pelas indústrias, pondo seus capitais a serviço da comunidade. São comerciantes por excelência e têm em suas mãos não só o comércio retalhista, mas também parte considerável da importação e da exportação de Corumbá e do Pantanal.

Comércio, Comerciantes – Denominações Diversas

Os libaneses e os sírios que vieram para o sul e para o centro do Brasil ficaram conhecidos pelo nome de turcos, por terem suas terras de origem pertencido ao antigo Império Otomano. Tornando-se independentes, conservou-se o uso do adjetivo “turco”. Os árabes (de fala árabe) que se radicam no Brasil não foram conhecidos pela mesma designação. Eles são árabes, sírios, libaneses, turcos etc.

A denominação varia de acordo com a região. Assim, no Ceará, os libaneses e os sírios são chamados de Galegos, herdado dos portugueses como comerciantes exóticos. No Pará, o árabe é conhecido pelo termo teque-teque, devido ao uso da matraca. No Ceará, no Maranhão e no Pará eram conhecidos como carcamanos, designação herdada dos italianos.

O comércio ambulante, tão rudimentar na colônia, foi tomando vulto com a melhoria dos meios de comunicação, servindo as picadas dos tropeiros e dos mascates para traçar novos caminhos de penetração. A exemplo das bandeiras, os vendedores ambulantes favoreceram a criação de núcleos urbanos, o florescimento de pequenas culturas e a introdução de novos objetos de uso pessoal e doméstico nas regiões mais afastadas.

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